terça-feira, 30 de julho de 2013

Verdade

Verdade
Carlos Drummond de Andrade

A porta da verdade estava aberta,
mas só deixava passar
meia pessoa de cada vez.

Assim não era possível atingir toda a verdade,
porque a meia pessoa que entrava
só trazia o perfil de meia verdade.
E sua segunda metade
voltava igualmente com meio perfil.
E os meios perfis não coincidiam.

Arrebentaram a porta. Derrubaram a porta.
Chegaram ao lugar luminoso
onde a verdade esplendia seus fogos.
Era dividida em metades
diferentes uma da outra.

Chegou-se a discutir qual a metade mais bela.
Nenhuma das duas era totalmente bela.
E carecia optar. Cada um optou conforme
seu capricho, sua ilusão, sua miopia.

sexta-feira, 26 de julho de 2013

Meu jeito... do meu jeito

  My Way

 (Frank Sinatra)



"E pensar que eu fiz tudo isto
E devo dizer, sem muita timidez
Ah não, ah não, não eu
Eu fiz tudo do meu jeito..."

terça-feira, 23 de julho de 2013

História da Educação Pública: apontamentos de leitura




Por Ernaldina Sousa Silva Rodrigues
Lorenzo Luzuriaga Medina nasceu em Valdepeñas, província da Cidade Real em 29 de outubro 1889- Tucumán, Argentina, em 1959 aos 70 anos de idade. Pedagogo espanhol, estudou magistério em Madrid. Foi aluno e professor do Instituto Livre de Ensino. Em 1913, a Junta de Ampliação de Estudos concedeu uma bolsa para Luzuriaga estudar na Alemanha, por dois anos. Quando regressou, se incorporou à Liga de Educação Política. Em 1922 fundou a Revista de Pedagogia. Durante a Segunda República,  foi catedrático de Pedagogia da Faculdade de Filosofia e Letras de Madrid e se exilou na Grã Bretanha e Argentina depois da guerra civil, em 1939. Foi professor da Universidade Nacional de Tucumán. Logo após, se mudou para Buenos Aires em 1944 onde começou a trabalhar como diretor da Coleção Pedagogia da editora Losada, cujo comitê de leitura era um ninho de refugiados espanhóis. Trabalhou também para a editora A Leitura. Fundou com Francisco Ayala, que estava na editora Losada, a revista Realidade, publicando diversos números entre janeiro de 1947 a dezembro de 1949. Entre 1954 e 1955 lecionou na Universidade Central de Caracas, e em 1956 regressou para Buenos Aires sendo professor de Didática e História da Educação na  Faculdade de Filosofia e Letras. Levou a cabo uma intensa atividade publicitária com temas sobre educação. Defendeu na Espanha  as ideias do movimento da Escola Nova. Participou ativamente da política educativa da Segunda República espanhola, cujo programa escolar (escola única, ativa, pública e laica). Tinha como objetivo contribuir com a renovação política e técnica da educação como sistema e da metodologia e os instrumentos a serviço dos educadores. É autor de O ensino primário na Espanha (1915) , A preparação dos professores (1918), O analfabetismo na Espanha (1919) , A escola unificada (1922) , As escolas novas (1923) , Escolas de testes e reforma (1924) , Escolas ativas (1925) , A educação nova (1927) , Bases para um anteprojeto de Lei de Instrução Pública inspiradas na ideia da escola única (1931),  Ideias para uma reforma constitucional da educação pública (1931), A escola   única (1931) ,  A nova escola pública (1931), A educação nova (1942), A pedagogia contemporânea (1942), Reforma da educação (1945), História da educação pública (1946), Pedagogia (1950), História da educação e da Pedagogia (1951), Pedagogia social e política (1954), Antologia pedagógica (1956), A instrução livre de ensino e a educação na Espanha (1957), Dicionário de pedagogia, obra póstuma.(1)
Na época em que Luzuriaga viveu acontecia a Guerra Civil Espanhola. Conflito bélico que se instalou por trás de um falido golpe de estado de um setor do exército contra o governo legal da Segunda República Espanhola e que assolou o país entre 17 de julho de 1936 a 1 de abril de 1939. Nessa guerra saíram vitoriosos os rebeldes e se instaurou um sistema ditatorial (2) .

No livro História da educação pública, Luzuriaga discorre sobre a educação pública estatal, a educação pública nacional e a educação pública democrática.

No Capítulo II,  caracterizou o desenvolvimento cultural e pedagógico do século XVIII espiritual, política e pedagogicamente. Espiritualmente, foi  o século “das luzes”, da ilustração, do otimismo no poder da razão de organizar o mundo dos homens. Politicamente, foi o século do despotismo, da secularização da educação e de sua subordinação ao Estado. Pedagogicamente, foi o século do racionalismo, da crença no poder ilimitado da educação (Luzuriaga, 1959, p. 23-24).

O autor traça um panorama da pedagogia política dividida em três fases: na primeira, a educação puramente estatal começa na Alemanha com os reis da Prússia Frederico Guilherme I e Frederico II. Ambos têm a preocupação de constituir um Estado forte, bem organizado administrativamente, com bons funcionários e militares. Para tanto, estimulam a educação  “súdito”, do homem como instrumento do Estado. No primeiro reinado encontra-se a educação inspirada ainda pelas ideias religiosas, enfatizada pelo movimento pietista. No segundo, predominam as ideias racionalistas da “ilustração” (p. 24-30).

A educação pública estatal estende-se para a Áustria, França e Espanha sob a inspiração das ideias de Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), Montesquieu (1689-1755) e Diderot (1713-1784) (p. 26-39).

Na Segunda fase, a educação pública nacional começa na França com a Revolução Francesa (1789) e se caracteriza por estar voltada para o cidadão, ser de caráter cívico e patriótico, ser de direito e autônomo. A organização da educação pública francesa inicia-se com a Convenção (1792-1795) que deixou assentadas as bases da educação nacional (p. 40).

Nesta época, Adam Smith (1723-1790) e Malthus (1766-1834)  já defendiam a educação enquanto benéfica para a vida do cidadão e para o desenvolvimento do Estado.

Prosseguindo, Luzuriaga passa às considerações sobre o século XIX, contextualizando-o. Enfatiza o desenvolvimento da Revolução Industrial, o nascimento da classe operária, a extensão do sufrágio universal e a maior participação do povo nos assuntos públicos educacionais. Neste século, acirravam-se as lutas entre a Igreja e o Estado em torno da educação. O Estado vence essa luta e constitui uma educação pública nacional nos países europeus e americanos. A escola primária universal, gratuita, obrigatória e leiga e a secundária  limitam-se à burguesia objetivando a preparação para a Universidade.

O autor destaca a organização e os momentos principais do desenvolvimento da educação pública nacional na França, Alemanha, Inglaterra, Espanha e Estados Unidos da América. Em todos os países  revela-se a submissão da educação à influência da igreja e a luta em favor da laicização, obrigatoriedade e gratuidade da educação.

Na terceira fase, a educação pública democrática, século XX,  foi caracterizada como educação para todos, tendo como precursores Comenius, Condorcet, Fichte e Pestalozzi (p. 99)

Luzuriaga descreve e analisa o desenvolvimento da educação pública democrática na Alemanha, França, Inglaterra, Estados Unidos da América e Rússia.

Na Alemanha, a partir de 1848, segundo o autor, os partidos políticos democráticos e socialistas, as associações de professores e os pedagogistas de tendência liberal defendiam e lutavam por uma “escola unificada”, enquanto dever do Estado e direito do cidadão. Defendiam a educação básica para todos. Sendo assim, a educação democrática se identifica com o movimento da “escola unificada” e contagia a educação francesa (p.101).

Escola obrigatória  dos 6 aos 18 anos era o que defendiam os professores combatentes na primeira e pertencentes aos três graus de ensino, na França, a partir de 1916. A França foi o primeiro país  da Europa a introduzir a gratuidade no ensino secundário público (p.112-116).

Na opinião de Luzuriaga, a educação pública inglesa foi “a mais democrática da Europa”, porque assegurou a igualdade de oportunidades educacionais, criando serviços e funções na organização da educação. Os partidos políticos avançados e o partido trabalhista, em particular, defendiam a escola secundária para todos e a igualdade de oportunidades educacionais para pessoas de 5 a 18 anos, com frequência obrigatória.

O autor afirma que os Estados Unidos da América realizaram o maior progresso democrático no campo da educação, principalmente pelo seu espírito democrático e pela organização do ensino enquanto gratuito, da escola primária à universidade, e obrigatório proporcionalmente conforme idade e o número de estados. Os norte-americanos concebiam a educação com “igualdade de oportunidades educacionais” para todos, tanto no espírito democrático quanto na organização da educação.

Na Rússia, a educação se desenvolveu em passos mais lentos devido à influência da Igreja. A educação pública se desenvolveu com ênfase na politecnização da classe operária, com o objetivo de se implantar o comunismo sob forte influência do Partido Comunista Pan-russo. A educação era dirigida para a classe trabalhadora e totalmente voltada para o trabalho.

Luzuriaga debruça-se em expor os momentos essenciais dos processos históricos de cada período, descreve e pondera sobre a contribuição de representantes nos respectivos países e da influência e inspiração da educação pública estatal, nacional e democrática.
 
Referência:

LUZURIAGA, Lorenzo. História da educação pública. São Paulo: Companhia Editora nacional, 1959. Caps II, III e IV, p. 23-143.

segunda-feira, 22 de julho de 2013

Prece

"A prece não é um barulho que surpreende o ouvido, é um silêncio que penetra no coração."

Eliphas Levi

Nossos amigos

"O homem tem três amigos: o dinheiro, só até à morte; os parentes, até à sepultura; as boas obras para sempre." (Autor desconhecido)

Capacidade de amar


"Nenhum pecado que seu pai tenha cometido é forte o suficiente para destruir sua capacidade de amá-lo. "

terça-feira, 16 de julho de 2013

O pós-modernismo e o discurso da crítica educacional: apontamentos de leitura




Por Ernaldina Sousa Silva Rodrigues

Henry A. Giroux  nascido em Providence, Rhode Island, Estados Unidos, filho de emigrantes canadenses. Estudou historia em Barrington (1968-1974) e doutorou-se na Universidade de  Carnegie Mellon  de Pittsburgh (1977). Iniciou como docente na Universidade de  Boston (1977-1983), de lá passou para a Universidade de Miami em Oxford,1983-1992). Diretor do Centro Estudos de Educação e Cultura da Universidade de Miami. Catedrático na Universidade do Estado da Pennsylvania (1992). Seu trabalho acadêmico mais significativo consiste em integrar os estudos culturais dentro do estudo da educação e da Pedagogia, assim como  por sua crítica radical ao sistema educativo e cultural muito determinado pelo mercado das industrias culturais norteamericanas.[1]

Giroux é um crítico da cultura estabelecida nos Estados Unidos, arraigada nos circuitos do mercado, que apresenta como instrumento de socialização  valores democráticos  pobres, orientados à reprodução dos mitos que descrevem a realidade e a história norteamericanas. Denuncia os impérios culturais e mediáticos como  causadores do  desaparecimento do espaço público e o empobrecimento general dos norteamericanos desde as fases da infância e da juventude. Ao estabelecer una relação entre os estudos sobre educação e cultura, descreve os efeitos negativos sobre a socialização cívica.[2]

O ensaio O pós-modernismo e o discurso da crítica educacional, escrito por  Giroux, faz parte do livro intitulado Teoria educacional em tempos pós-modernos, organizado por Tomaz Tadeu da Silva.

Giroux inicia o texto com uma breve introdução que permite visualizar o desenvolvimento do capítulo que tem por base argumentos sobre o pós-modernismo frente a uma pedagogia crítica.

Primeiramente, o autor fornece uma base teórica sobre o significado do pós-modernismo por meio de um exame fundamentado nas visões de Jean-François Lyotard, Frederic Jameson e outros autores. Descreve o significado e a condição pós-moderna.

Na sequência, analisa a problemática pós-moderna no contexto do pós-modernismo e a crise da totalidade e do fundacionalismo; o pós-modernismo, cultura e a problemática da alteridade; o pós-modernismo e a crise da linguagem, da representação e da agência. Trata do ataque pós-moderno às teorias da totalidade e às narrativas mestras; do desenvolvimento de uma política que trate a cultura popular e afirme a importância das culturas minoritárias; enfatiza questões sobre alteridade e sobre as vozes dos grupos marginalizados e sobre a subjetividade.

Finalmente, Giroux explicita os insights oferecidos pelo pós-modernismo aos educadores como parte de uma teoria mais ampla de escolarização e de pedagogia crítica (GIROUX, 1993, p. 63).

O ensaio de Giroux fundamenta-se essencialmente no campo teórico, discursivo, argumentativo. Oferece algumas ideias para que possamos pensar criticamente na modernidade e pós-modernidade, ponderando e combinando realmente os elementos que perpassam as duas teorias. Precisamos analisar a modernidade e a pós-modernidade de uma maneira dialógica, não linear; integrando os excluídos socialmente, outras manifestações culturais e identidades sociais e as vozes dos excluídos ao longo do século e da história.

Necessário se faz desenvolver novas formas de linguagem e de práticas críticas que integrem pessoas e desvele o currículo oculto no processo educativo. O importante é reelaborar as narrativas mestras e as teorias da totalidade para investir em outras maneiras de ver o mundo e a escola, local de formação, de complexidade e embate de relações sociais.

Referência:

GIROUX, H. A. O pós-modernismo e o discurso da crítica educacional. In: Silva, Tomaz.Tadeu (Org.). Teoria educacional em tempos pós-modernos. Porto Alegre: Artes Médicas, 1993, p. 41-69.


[2] Ibid.  Acesso  em: 25 jun. 2007.

segunda-feira, 15 de julho de 2013

Apesar de você


Apesar de você (Chico Buarque) Clube da Música Atibaia

Hoje você é quem manda
Falou, tá falado
Não tem discussão
A minha gente hoje anda
Falando de lado
E olhando pro chão, viu
Você que inventou esse estado
E inventou de inventar
Toda a escuridão
Você que inventou o pecado
Esqueceu-se de inventar
O perdão
Apesar de você
Amanhã há de ser
Outro dia
Eu pergunto a você
Onde vai se esconder
Da enorme euforia
Como vai proibir
Quando o galo insistir
Em cantar
Água nova brotando
E a gente se amando
Sem parar
Quando chegar o momento
Esse meu sofrimento
Vou cobrar com juros, juro
Todo esse amor reprimido
Esse grito contido
Este samba no escuro
Você que inventou a tristeza
Ora, tenha a fineza
De desinventar
Você vai pagar e é dobrado
Cada lágrima rolada
Nesse meu penar
Apesar de você
Amanhã há de ser
Outro dia
Inda pago pra ver
O jardim florescer
Qual você não queria
Você vai se amargar
Vendo o dia raiar
Sem lhe pedir licença
E eu vou morrer de rir
Que esse dia há de vir
Antes do que você pensa
Apesar de você
Amanhã há de ser
Outro dia
Você vai ter que ver
A manhã renascer
E esbanjar poesia
Como vai se explicar
Vendo o céu clarear
De repente, impunemente
Como vai abafar
Nosso coro a cantar
Na sua frente
Apesar de você
Amanhã há de ser
Outro dia
Você vai se dar mal
Etc. e tal
La, laiá, la laiá, la laiá

terça-feira, 9 de julho de 2013

A inteligência cega e o paradigma da complexidade: apontamentos de leitura



Por Ernaldina Sousa Silva Rodrigues 

Edgar Morin é sociólogo e presidente da Agência Européia para a Cultura. Escreveu o Livro Introdução ao Pensamento Complexo no qual constam os textos sobre A Inteligência Cega e O paradigma da Complexidade.

O autor, no capítulo sobre A Inteligência Cega, mostra que as ignorâncias, as cegueiras e os perigos têm caráter comum que resulta de um modo mutilador de organização do conhecimento, incapaz de reconhecer e apreender a complexidade do real.

O problema da organização do conhecimento contra-se na utilização da lógica comandada por paradigmas, princípios ocultos que governam a nossa visão das coisas e do mundo sem que disso tenhamos consciência.

Advoga que a patologia ou a doença do saber está na inteligência cega. Esta destrói os conjuntos e as totalidades, isola todos os objetos daquilo que os envolve, não concebendo o elo inseparável entre o observador e a coisa observada. Assim, as realidades chaves são desintegradas, aproximando-nos de uma mutação no conhecimento.

O que é a complexidade? Pergunta Morin. Responde que é o tecido de acontecimentos, acções, interacções, retroacções, determinações, acasos, que constituem o nosso mundo fenomenal (p.20). Conclui que estamos ainda cegos perante o problema da complexidade e que esta cegueira faz parte da barbárie (p.23). O pensamento complexo, na visão de Morin, tem o papel de sensibilizar para as carências do nosso pensamento e fazer compreender que um pensamento mutilador conduz a ações mutiladoras. Clama a todos para tomar consciência da patologia contemporânea do pensamento (p. 22).

No capítulo 3, intitulado O paradigma da complexidade, Morin trata do paradigma da simplicidade, da ordem e desordem do universo, da auto-organização, da autonomia, da complexidade e completude, da razão, racionalidade, racionalização, das necessidades dos macroconceitos, dos três princípios, do todo que está na parte que está no todo e para a complexidade.

Explica o paradigma da simplicidade como um paradigma que põe ordem no universo e expulsa dele a desordem. A ordem estaria reduzida a uma lei, a um princípio. O princípio da simplicidade separa o que está ligado (disjunção) e unifica o que está disperso (redução) (p.86).

A desordem e a ordem sempre é inimiga uma da outra, cooperam de uma certa maneira para organizar o universo (p.89). Para ilustrar, cita o exemplo do big gang. Nesse sentido, o universo começou com uma desintegração, uma desordem, e ao desintegrar-se, se organiza (p.90). A desordem e a ordem crescem uma e outra no seio de uma organização que se complexificou.

A auto-organização, explicitada por Morin, passa pelo sujeito autônomo, dependente, provisório, vacilante, inseguro, que é quase tudo por si e quase nada pelo universo. A autonomia do sujeito é complexa, porque alimenta-se da dependência de condições culturais e sociais. 

Somos seres complexos e a consciência dessa complexidade traz a aspiração à complexidade de seres solidários e multidimensionais. Mas, traz, também, a compreensão de não podermos escapar da incerteza e de que nunca teremos um saber total da realidade que nos cerca.

Na autocrítica complexa da noção de razão, o autor define razão como uma vontade de se ter uma visão coerente dos fenômenos, das coisas e do universo (p.101). A razão como aspecto lógico, a racionalidade seria o diálogo com a lógica da razão. A racionalização encerra a realidade num sistema coerente (p.102).

Finalmente, o autor explica os três princípios que poderiam ajudar a pensar a complexidade: princípio dialógico, permite-nos manter a dualidade no seio da unidade. Associa dois termos ao mesmo tempo complementares e antagônicos (p.107); princípio da recursão organizacional centra-se na idéia de que tudo o que é produzido volta sobre o que produziu num ciclo ele mesmo auto-constitutivo, auto-organizador e autoprodutor (p.108); o princípio hologramático está ligado à idéia recursiva, que por sua vez está em parte ligada à idéia dialógica (p.109). Tudo está interligado: o todo está na parte que está no todo.

A complexidade do real é pensada no paradigma da própria complexidade. São novas visões, concepções, descobertas e reflexões baseadas na  crítica e na autocrítica do conhecimento dito moderno. O autor nos alerta para a necessidade do diálogo permanente com a descoberta (p.105). Chama a atenção para a cegueira em torno de nossos conhecimentos e para a necessidade de uma tomada de consciência radical, de uma (re)organização crítica e autocrítica de nossas teorias e ideologias. A inteligência cega gera a doença do saber, a ignorância. A cegueira leva-nos ao uso degradado da razão científica. Passamos a pensar e a agir como fantoches manipulados, determinados pela realidade que nos cerca. Se a nossa inteligência é cega, estamos privados de visão, abarcados por uma afeição extrema com relação ao desenvolvimento da ciência e às ameaças ligadas a progresso descontrolado do conhecimento que já levou (exemplo: guerras mundiais) e poderá levar a catástrofes ainda mais graves para a Humanidade. Parafraseando Boaventura de Sousa Santos (2002, p.23), precisamos de um conhecimento prudente para uma vida decente.

Os textos de Morin poderão servir para aquelas pessoas que desejarem fazer uma “viagem” teórica sobre o pensamento complexo e para uma reflexão sobre a realidade que “ignoramos”. Ignoramos ou por desconhecimento ou pela complexidade que envolve essa complexidade. Na realidade, essa complexidade foi e é criada pelo próprio homem que deseja a totalidade do universo.

Referência: 

MORIN, E.  Introdução ao Pensamento Complexo.  Lisboa:  Instituto  Piaget, 1990, Caps. 1 e 3.

SOUSA SANTOS, Boaventura. Um discurso sobre as ciências. 98 ed. Porto: Ed. Afrontamento, 2002.