Por Robson Barbosa e Thaís Artmann (Cassel Ruzzarin Santos Rodrigues Advogados)
Em 21 de outubro de 2015, a Comissão de Direitos Humanos e Legislação
Participativa do Senado Federal aprovou o parecer dado pelo relator
senador Paulo Paim ao Projeto de Lei 287/2013, que pretende regular o
direito à negociação coletiva e greve dos servidores públicos. Todavia,
tal qual um boomerang, ao passo em que traz consigo avanços em relação
aos problemas históricos da liberdade sindical no serviço público,
também contém retrocessos que anulam seus benefícios.
Para isso perceber, é importante relembrar que, com a promulgação da
Constituição da República de 1988, aos servidores públicos foi permitida
a associação sindical, contudo, vieram as controvérsias acerca do
exercício da greve e da negociação coletiva.
Isto porque a greve deveria ser exercida “nos limites definidos em
lei específica” que ainda não foi editada, mesmo após 27 anos da sua
previsão constitucional. Para amenizar essa omissão, o Supremo Tribunal
Federal, através dos Mandados de Injunção 670, 708 e 712, estendeu aos
servidores a disciplina da Lei 7.783/1989, originalmente aplicável às
paralisações da iniciativa privada, deixando a critério dos Tribunais a
conformação dessa norma às greves no serviço público, caso a caso, o que
gera certa insegurança jurídica acerca desses movimentos. Já sobre a
negociação coletiva, desde o julgamento pelo STF da ação direta de
inconstitucionalidade 492, foi negada essa forma de diálogo
institucionalizado para os servidores, tornando a greve o único e
gravoso veículo de expressão das suas reivindicações.
O PLS 287/2013 visa sanar essas incongruências com a garantia
normativa da greve e da negociação para os servidores, contudo, mesmo
com pontos favoráveis, analisando-o na sua íntegra, não é possível
afirmar que a categoria teria muitos motivos para comemorar a sua
aprovação.
A começar pelos pontos positivos, na proposta original do PLS
287/2013, havia a figura da mesa de negociação coletiva em caráter
permanente, prevendo que as entidades de classe deveriam, até fevereiro
de cada ano, convocar assembleia-geral a fim de deliberar sobre as
reivindicações da categoria a serem defendidas durante o processo de
negociação coletiva, o que dava margem à interpretação de que somente
uma vez por ano é que haveria a obrigação de diálogo entre a
administração e os servidores. Esse caráter foi substituído pelo
emergencial, o que gera dois benefícios aos servidores: a
institucionalização da negociação coletiva e a possibilidade de diálogo
sempre que necessário.
Também é benéfico o PLS 287/2013 quando repete a previsão
constitucional de que somente os militares das Forças Armadas não têm
direito de realizar greve, pois o efeito dessa exclusão consiste na
decorrência lógica de que todos os demais servidores podem utilizar
dessa ferramenta, tornando ilegítima qualquer declaração de ilegalidade
em razão dos sujeitos que a exercem.
Mas os aspectos negativos do PLS 287/2013 iniciam quando não prevê a
obrigatoriedade da presença de uma autoridade com poder decisório para
negociar diretamente com os servidores, pois abre margem para processos
de “negociação de fachada”, vez que não estarão os servidores negociando
com alguém que possa atendê-los.
Não bastasse isso, o PLS 287/2013 autoriza que as proposições
apresentadas pela mesa de negociação sejam homologadas ou aditadas pelo
titular do respectivo poder, ou seja, após o processo de negociação, o
que restar acordado poderá ser unilateralmente alterado, o que não
aconteceria se na mesa de negociação houvesse alguém com poder decisório
para validar, na mesma oportunidade, os termos do acordo. Qual o efeito
disso? Novas greves para lutar pelas reivindicações que não foram
atendidas em razão do tal “aditamento”!
Ademais, o PLS 287/2013 afirma que os motivos e a oportunidade da
greve escolhidos pela categoria serão submetidos a juízo de
proporcionalidade e razoabilidade, o que pode retirar dela toda sua
eficácia, pois funciona em momentos inoportunos para a administração a
forçar com que as reivindicações sejam discutidas. Tal previsão também é
inconstitucional porque o juízo sobre a oportunidade da greve compete
exclusivamente aos trabalhadores.
Por fim, é também prejudicial a previsão de que 70% dos servidores
lotados em um mesmo órgão ou unidade administrativa estão autorizados a
fazer greve, mantendo-se 30% restantes trabalhando, pois parte do
pressuposto de que os servidores e administração não são capazes de
obter consenso sobre qual a força de trabalho é necessária para cumprir
com o mínimo da continuidade dos serviços públicos, gerando dois outros
problemas: órgãos que precisam de mais servidores em atividade terão
déficit na prestação de serviços e órgãos quem podem manter a
regularidade sem o encargo de um número excessivo de servidores.
Esse quadro explica o efeito boomerang caso aprovado o PLS 287/2013
em seus atuais termos, pois avança em muitos pontos na mesma medida em
que retrocede, fazendo com que o que parecia ser a esperança da
regulação de direitos tão cruciais aos servidores se torne um novo
problema, tudo com reflexos negativos sobre a continuidade dos serviços
públicos.
Fonte: < http://www.blogservidorlegal.com.br/projeto-de-lei-que-regulamenta-greve-de-servidor-tem-efeito-boomerang/>
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